O Capital Social é a cifra correspondente ao valor aportado pelos sócios ou o valor que os sócios se obrigam a aportar. Pode ser aportado em moeda corrente ou ainda, em ativos, sejam bens imóveis ou móveis, contanto que não sejam supervalorizados.
O capital social é um conceito central no direito societário, que se refere aos recursos financeiros e patrimoniais investidos pelos sócios em uma empresa. Nesse sentido, é fundamental compreender a função e as formas de integralização, bem como as implicações legais e doutrinárias decorrentes desse instituto.
Este pode ser definido como o montante de recursos que os sócios investem na empresa, seja em dinheiro, bens ou direitos. Segundo Fábio Ulhoa Coelho[1] (2019, p. 165), “o capital social é a expressão monetária do valor atribuído pelos sócios à sociedade limitada, que se torna o patrimônio inicial desta”.
Conforme destaca Ricardo Negrão[2] (2018, p. 267), “o capital social é uma garantia da solvabilidade da sociedade, isto é, da capacidade da sociedade de cumprir as suas obrigações perante terceiros”. A integralização do capital social é o processo pelo qual os sócios transferem recursos financeiros e patrimoniais para a empresa, em troca de participação societária.
De acordo com a legislação brasileira, a integralização do capital social pode ser feita de diversas formas, tais como:
A integralização do capital social é um requisito obrigatório para a constituição de uma empresa, bem como para a realização de aumentos de capital. Conforme ressalta Rubens Requião[3] (2015, p. 202), “a integralização é o ato pelo qual se efetiva o ingresso do capital social na sociedade, e, consequentemente, a aquisição da qualidade de sócio”.
O objetivo da criptomoeda era criar uma moeda que existisse em um ambiente onde flutuações, transações e valorizações não dependessem das instituições financeiras, ou mesmo de interesses políticos, governamentais, ou das grandes instituições.
De acordo com o artigo ‘’as criptomoedas e os novos desafios ao sistema monetário: uma abordagem pós-keynesiana’’[4], antes da criação de meios monetários tecnológicos, a sociedade deparou-se com a criação da moeda, que até os dias atuais, continua a intrigar estudiosos e gerar discussões sobre o que de fato é a moeda.
Apesar de serem parecidas, as moedas digitais e as criptomoedas possuem características um pouco diferentes na forma de atuação, sendo a segunda caracterizada por ser uma moeda utilizada em um sistema de pagamentos descentralizado e peer-to-peer, sem sujeição, portanto, a um órgão regulador ou supervisor centralizado (Huberman et al., 2017). Portanto, as moedas cripto nascem desvinculadas das moedas fiduciárias, não dependendo de nenhum agente de regulamentação ou lastro, e principalmente, oferecidas em uma quantidade limitada (Chuen, 2015).
Com relação ao entendimento de que os Bitcoins e demais criptomoedas podem vir a se tornar moedas propriamente ditas, é necessário lembrar que para que determinado ativo receba a denominação de ‘’moeda’’, esta precisa encaixar-se em três fundamentos principais: (i) unidade de conta; (ii) meio de pagamento; e (iii) reserva de valor).
Para alcançar esse patamar, é necessário que ela tenha a elasticidade de não ser produzida de forma privada (já que Constitucionalmente falando, a emissão de moeda torna-se uma responsabilidade da União), e nem que possa ‘’vazar’’ por outros ativos – não pode ter a característica de ser ‘’líquida’’.
Outro ponto fundamental dentro dessa discussão, é se a criptomoeda possui as mesmas características funcionais do modelo já inserido no sistema bancário atual, como ser universalmente aceito para liquidação de contratos, pagamentos e dívidas (pois é isso que faz com que os bancos tenham a confiança da sociedade para lidar com o dinheiro alheio).
É um ativo de valorização futura e especulativa. A “transformação” do Bitcoin em ativo especulativo vai contra, inclusive, à concepção original de seus criadores. A “moeda” que não possui regras ou até mesmo comando dentro de um sistema capitalista movido a base de transações financeiras.
E por mais que possua estudos em diversos países atualmente, como Canadá, de criação de uma modalidade criptomoedas estatais, já se constata a influência que isso teria na condução da da política monetária nacional, impactando diretamente em aspectos como nível de renda e emprego, demonstrando dessa maneira que a criptomoeda jamais conseguirá estar atrelada ao meio de controle estatal em sua eficiência completa, pois não fora desenvolvida para isso.
De acordo com a Instrução Normativa 1889/19, a Receita Federal brasileira compreende as diferenças entre dois conceitos. A lei define como cripto ativo: a representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia, podendo esse inclusive ser utilizado como forma de investimento, transferência de valores e acesso a serviços.
Já com relação a sua definição de exchange de cripto ativo, seu entendimento é de que se trata de pessoa jurídica, ainda que não financeira, que oferece serviços referentes a operações realizadas com cripto ativos, inclusive intermediação, negociação ou custódia, e que pode aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros cripto ativos.
Em seu art. 4º, ainda evidência da conversão de valores em reais, sendo aceitos somente em dólar americano e moeda nacional, respeitando as leis cambiais vigentes, como respeito ao valor cambial em vigor no dia da operação, devendo ser retirada obrigatoriamente do boletim PTAX, emitido pelo Banco Central do Brasil.
A Instrução procura ser específica quando define somente dois casos em que a prestação de informações é necessária: a) a exchange de cripto ativos domiciliada para fins tributários no Brasil; ou então quando b) as operações forem realizadas em exchange domiciliada no exterior ou não forem realizadas em exchange.
Ou seja, a grande preocupação da Receita Federal no atual momento é tentar criar um tipo de vínculo (ou até lastro) que ligue o ativo a pessoa que a movimenta, de tal forma a criar um determinado controle sobre o que entra no país.
É compreensível que a Receita tente fazer com que isso seja possível, por mais que toda a proposta trazida pela Instrução Normativa vá em contrapartida à característica principal da cripto moeda – e vá contra, principalmente, ao objetivo dos adquirentes desse tipo de modalidade financeira: o de não deixar pistas de suas movimentações econômicas.
A norma estabelece um valor mínimo para apresentação das movimentações: qualquer valor, isolado ou em conjunto, que ultrapasse R$ 30.000,00 (trinta mil reais), o que se levado em conta quando analisado da perspectiva macroeconômica do poder de compra das pessoas físicas/jurídicas que adquirem tal ativo, verifica-se que a Receita Federal consegue rastrear praticamente toda e qualquer transação.
Mas, a legislação ainda vai além, estabelecendo quais as operações que devem ser apresentadas mensalmente, estando entre elas: I – compra e venda; II – permuta; III – doação; IV – transferência de cripto ativo para a exchange; V – retirada de cripto ativo da exchange; VI – cessão temporária (aluguel); VII – dação em pagamento; VIII – emissão; e IX – outras operações que impliquem em transferência de cripto ativos.
Como dito acima, é visível qual a intenção por de trás de toda essa movimentação grandiosa da Receita, por mais que, até certo ponto, esse objetivo seja dúbio: permitir a entrada de cripto ativos em solo nacional de maneira ‘’legalizada’’, mas claro, tendo o pleno controle e conhecimento do ciclo de vida desse ativo até então, pouco compreendido pelos meios do mercado financeiro mundial.
É nesse momento que é capaz de visualizar claramente os pontos já discutidos acima, quando se discorreu sobre a capacidade de um cripto ativo ser considerado uma moeda corrente: o agente estatal entra em ação mais uma vez para ‘’colocar ordem’’ naquilo que parece desordenado demais, porém sempre procurando passar a imagem de que é um grande progressista dos meios financeiros.
Abrangendo as operações da forma tal qual foi feita, focalizando principalmente nas modalidades mais usadas dentro do direito brasileiro atual, excluem-se inclusive em uma taxa grande, a incidência de possíveis fraudes por tais meios. O Estado cumpre seu papel como controlador da moeda e da segurança monetária nacional, impedindo que a circulação de tal ativo venha a causar as incoerências tratadas anteriormente, e que poderiam trazer prejuízos à sociedade, quando tratados como moeda corrente.
Dentro desse controle, quase que absoluto, diga-se de passagem, estabelecido pela Receita Federal, encontram-se no Capítulo IV – Das Informações sobre Operações com Criptoativos, há a relação das informações que devem ser prestadas impreterivelmente, para que se chegue à localização exata do proprietário do ativo, sem que sejam precisos esforços, fornecendo o passo a passo para envio.
As penalidades giram em torno de algumas hipóteses, sendo elas:
Art. 10. A pessoa física ou jurídica que deixar de prestar as informações a que estiver obrigada, nos termos do art. 6º, ou que prestá-las fora dos prazos fixados no art. 8º, ou que omitir informações ou prestar informações inexatas, incompletas ou incorretas, ficará sujeita às seguintes multas.
As multas giram em torno de valores que começam aos R$ 100,00 reais e vão até os R$ 1.500,00 reais, dependendo do ocorrido, podendo incorrer também em porcentagens de multas aplicadas sob o valor declarado à Receita, que podem incidir diariamente em aumento, caso o declarante não cumpra com a obrigação.
No geral, podemos observar o conservadorismo cultural na conduta adotada pela Receita Federal, que em um movimento mundial econômico de procurar inserir (a sua maneira) a maré de cripto ativos na realidade brasileira, trouxe consigo a criação na Instrução Normativa nº 1889/19 da possibilidade de brasileiros manterem os ativos (que antes somente poderiam ser mantidos no exterior), agora em solo brasileiro. Mas até que ponto isso é benéfico? Até que ponto, pensando sob a ótica do cidadão que adquire tal ativo, possui ao trazer determinado bem ao Brasil, sendo taxado por isso?
Importante ressaltar que, a IN 1889/19 não estabelece de forma expressa se os ativos serão taxados ou não a partir do momento que mantidos em solo brasileiro, mas, se levarmos em conta o histórico financeiro e econômico brasileiro, pode-se ter uma ideia de que muito em breve, com a aceitação e adequação do brasileiro às novas normas da Receita, isso pode se tornar possível.
É de se questionar se a Instrução se torna efetiva em seu objetivo. Do ponto de vista do Estado brasileiro, a regulamentação de ativos trás mais segurança aos órgãos de regulamentação e ao governo, em saberem exatamente o cenário que encontraram dali em diante para que novos movimentos sejam possíveis.
Do ponto de vista do possuidor do ativo, a norma, quando analisada puramente, perde sua lógica e sentido normativo quando estabelece controles excessivos para algo que, em sua essência, busca a menor quantidade de registros e lastros possíveis. A longo prazo, isso será efetivo? A legislação brasileira mudará seu entendimento perante o crescimento exponencial de cripto ativos em circulação pelo mundo?
Se as demais legislações futuras vierem em consonância com a IN 1889/19, pode-se prever que não.
Nos últimos anos, o mercado de criptoativos tem crescido exponencialmente em todo o mundo, gerando um grande interesse por parte de investidores e reguladores. No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem sido uma das principais instituições responsáveis por regulamentar e orientar a atuação de empresas e investidores nesse mercado. Neste sentido, o Parecer de Orientação nº 40, publicado pela CVM em 2022, traz importantes esclarecimentos sobre o entendimento do órgão regulador em relação aos criptoativos.
O termo criptomoedas, por sua vez, vem sendo utilizado para designar ativos representados digitalmente com base em tecnologias descentralizadas e algoritmos criptográficos com finalidade de simular funções de moeda (meio de pagamento, unidade de conta e reserva de valor).
A criptomoeda é usualmente referida como uma das três espécies de criptoativos, junto com o utility token e o security token. Importada da língua inglesa, a expressão “token” designa a representação do ativo digital. Em uma tradução livre, pode ser compreendida como sendo um “cupom digital”.
O Parecer de Orientação nº 40 da CVM tem como objetivo esclarecer a natureza jurídica dos criptoativos e definir quando estes devem ser considerados valores mobiliários e, portanto, sujeitos à regulação da autarquia. Segundo o parecer, criptoativos são ativos digitais que podem ser negociados em redes descentralizadas, utilizando criptografia para garantir a segurança das transações.
Ainda segundo o parecer, a natureza jurídica dos criptoativos depende da forma como estes são emitidos e negociados. Quando os criptoativos são emitidos por meio de uma oferta pública, com a finalidade de captar recursos, e apresentam características semelhantes às de valores mobiliários, eles devem ser considerados como tais e, portanto, estar sujeitos à regulação da CVM.
Por outro lado, quando os criptoativos são negociados em ambiente exclusivamente descentralizado, sem a intervenção de uma pessoa jurídica, e não apresentam características de valores mobiliários, eles não estão sujeitos à regulação da autarquia.
Neste sentido, o Parecer traz importantes esclarecimentos para empresas e investidores que atuam no mercado de criptoativos, pois define claramente quando esses ativos devem ser considerados como valores mobiliários e, portanto, sujeitos à regulação da autarquia.
O criptoativo pode, a depender das suas características, configurar um contrato de investimento coletivo, cuja oferta pública no Brasil, por consequente, está sujeita a registro ou à dispensa de registro na CVM.
Logo de início, fica claro que a CVM entende positivamente a presença de cripto ativos no mercado econômico brasileiro, que diz: ‘’A adoção de tecnologias deve ser feita como uma forma de ampliação de horizontes e, não, uma limitação da extensão com que direitos podem ser exercidos’’.
A CVM compreende que existe um critério funcional para o que chama de ‘’taxonomia de tokens’’, no qual a sua classificação divide cada um deles dentro da sua funcionalidade, de forma a indicar o tratamento jurídico mais indicado a cada um destes. São, até o momento, três classificações:
Um ponto importante a ser destacado é de que a CVM informa sobre a possibilidade de ativos encaixarem-se em mais de uma classificação, dependendo das funções desempenhadas ou dos direitos a ele associados, de maneira que o token referenciado por ser ou não, um valor mobiliário.
Isso dependerá também da sua essência econômica e dos direitos conferidos aos titulares dos ativos, bem como da função desempenhada na operação relacionada.
Com relação a isso, a CVM trás um tópico fundamental na discussão que é a possibilidade de um token representar, não somente ativos, mas também direitos de remuneração em empreendimentos diversos, como direitos relacionados a estruturas assemelhadas às de securitização, ou, ainda, direito de voto[6].
A posição de entendimento da autarquia é de que apesar de alguns modelos existentes encaixarem-se nas estruturas de emissão de tokens pelo conceito de valor mobiliário, contudo, a CVM reforça que a divisão vista acima sobre a taxonomia não tem como objetivo consolidar uma definição de cada classificação ou até mesmo limitar o alcance da CVM enquanto autarquia, dependendo, portanto, da análise de cada caso.
Mas, apesar disso, a interpretação que se tem, é de que há possibilidade da integralização de criptoativos em outras operações, não necessariamente encaixando-se como valor mobiliário.
Quanto ao primeiro questionamento, o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários já se manifestaram a respeito do assunto: o BCB emitiu comunicados afirmando que “as chamadas moedas virtuais não se confundem com a ‘moeda eletrônica’ de que tratam a Lei 12.865/2013, e sua regulamentação infralegal”; e a CVM emitiu notas afirmando que “tais ativos virtuais, a depender do contexto econômico de sua emissão e dos direitos conferidos aos investidores, podem representar valores mobiliários, nos termos do art. 2º da Lei 6.385/1976”.
A Lei de Liberdade Econômica foi usada como referência para o OFÍCIO CIRCULAR SEI nº 4081/2020/ME emitido em 2020[7], no que diz respeito a autonomia empresarial e qual deverá ser o papel da Administração Pública quando se falar sobre práticas de combate ao abuso do poder regulatório.
Quanto as formalidades que deverão ser adotadas pelas Juntas Comerciais, o ofício é direto em dizer que não existem formalidades nesse aspecto a serem seguidas quando o assunto for a integralização do capital social a partir de cripto moedas, devendo ser respeitadas as regras que são usadas para integralização a partir de bens móveis.
O próprio ofício cita inclusive o art. 997, inciso III do Código Civil brasileiro e o art. 7º da Lei 6.404/1976 para justificar seu entendimento quanto a integralização:
Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará:
III – o capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;
Art. 7º O capital social poderá ser formado com contribuições em dinheiro ou em qualquer espécie de bens suscetíveis de avaliação em dinheiro.
Por fim, pode-se auferir que o entendimento das Juntas Comerciais como positivo a integralização – por mais que o papel das Juntas não seja extremamente relevante nesse aspecto, vai de encontro ao parecer dos demais órgãos reguladores em operação no Brasil, como a Receita Federal, o Banco Central do Brasil e a própria CVM.
[1] “Curso de Direito Comercial – Volume 1’’. Coelho, Fábio Ulhoa. p. 165, Editora Saraiva, 2019.
[2] “Manual de Direito Comercial e de Empresa”. Negrão, Ricardo. p. 267, Editora Saraiva, 2018.
[3] “Curso de Direito Comercial – Volume 1’’. Requião, Rubens. p. 202, Editora Saraiva, 2015.
[4] ’’As criptomoedas e os novos desafios ao sistema monetário: uma abordagem pós-keynesiana’’. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1982-3533.2020v29n3art04. Último acesso em 24/04/2023.
[5] Para uma análise do conceito de stablecoin e sua relação com o conceito de valor mobiliário, cf. INTERNATIONAL ORGANIZATION OF SECURITIES COMMISSIONS – IOSCO, Global Stablecoin Initiatives. Madrid, 2020. Disponível em https://www.iosco.org/library/pubdocs/pdf/IOSCOPD650.pdf, último acesso em 24/04/2023.
[6] Cf. CVM, “Initial Coin Offerings (ICOs)”, Rio de Janeiro, 16/11/2017, Disponível em: https://www.gov.br/cvm/pt-br/assuntos/noticias/initial-coin-offerings–icos– 88b47653f11b4a78a276877f6d877c04, último acesso em 24/04/2023.
[7] OFÍCIO CIRCULAR SEI nº 4081/2020/ME, disponível em: < https://www.conjur.com.br/dl/oficio-circular-sei-n40812020me-juntas.pdf>. Último acesso em 25/04/2023.
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